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Otávio Cunha é entrevistado pela Assembleia de Minas Gerais

07/05/2013 | Geral

1) Que critérios devem ser levados em conta para aplicar uma política tarifária que seja economicamente viável e justa socialmente?

A melhor maneira de estabelecer uma política tarifária é separar o valor da tarifa pública do custo do serviço. Nesse sentido, cabe ao poder público (órgão gestor) a definição do nível de serviço (frequência, conforto, confiabilidade, etc) a ser oferecido à população. Obviamente, quanto maior for o nível desejado maior serão os custos da operação dos serviços. O Capítulo II da Lei Federal 12.587/2012 é a referência legal para o entendimento desses critérios e decisões.

Ademais, é importante ressaltar que a tarifa pública dos serviços de transporte urbano coletivo de passageiros deve ser um instrumento de política social. Portanto, o valor da tarifa pública deve ser compatível com o poder aquisitivo daqueles que dependem do transporte público. A diferença entre o custo do serviço e a tarifa pública deve ser subsidiada pelo estado. Este custo deve ser repartido proporcionalmente com toda sociedade.

2) Uma apresentação da ViaQuatro afirma que 20% da receita tarifária é impactada pelos índices de qualidade. Isso procede? De que maneira?

O serviço de transporte metro ferroviário é considerado em todo o mundo como um transporte de alta qualidade, seguro, acessível e confiável. Esses atributos requerem administração eficiente, alta tecnologia e procedimentos padronizados, com normas e manuais de organização de serviço muito rígidos. A qualidade do serviço prestado, aliada a qualidade de manutenção, é que garantem o alto nível do serviço.

3) Nos sistemas de transporte municipais, em 90% dos casos, a decisão de reajuste nas tarifas é tomada pelo prefeito (de acordo com pesquisa do NUT de 2005 – há alguma mais recente?). No caso dos sistemas intermunicipais de ônibus e dos sistemas de transportes sobre trilhos, quanto à bilhetagem, a quem cabe essa decisão?

O serviço de transporte público municipal seja por ônibus ou sob trilhos, a decisão do reajuste de tarifas é de competência do prefeito. No caso do transporte público intermunicipal a competência é do governo do estado.

4) Quantos municípios dispõem da Câmara de Compensação Tarifária (CCT) atualmente? Nas cidades, a CCT é gerida mais pelo poder público ou pelo setor privado? E em Belo Horizonte? Qual sua avaliação da CCT em relação à política tarifária empregada em Belo Horizonte? Atualmente ela é onerosa ou não?

A CCT em Belo Horizonte é um modelo de política tarifária que considero de sucesso, porque se aperfeiçoou ao longo do tempo. Corrigiu distorções. Por exemplo:
- Estabeleceu padrões de serviços muito rígidos, e de desempenho operacional de alta qualidade. Assim, nivelou por cima a qualidade do serviço oferecido;
- Poucas cidades brasileiras se aproximam dos índices de desempenho operacional que Belo Horizonte oferece aos usuários do sistema de transporte público, graças a uma gestão pública eficiente, alinhada com uma parceria responsável com os operadores privados, conscientes do seu papel enquanto concessionários de serviço público. O nível do serviço oferecido à população é muito bom.


5) Qual o critério ideal adotado para reajuste de tarifa? Historicamente, o crescimento da tarifa média fica abaixo ou acima do IPCA e do IGP-M?

O IPCA e o IGP-M não são os índices ideais para refletir o custo do sistema de transporte. O ideal seria criar um índice próprio do transporte público, considerando algumas variáveis próprias do setor, porque alguns insumos não obedecem aos índices de IPCA e IGPM. Entre esses insumos, pode-se destacar o óleo diesel, os veículos, os pneus e principalmente os trabalhadores do setor, que tem obtido ganhos reais salário nos últimos anos. Na verdade, considerando a série histórica desde 2006, a variação acumulada da tarifa média das capitais brasileiras (47,80%) é maior do que os valores acumulados do IPCA (42,08%) e menor do que o IGP-M (52,31%).  [Veja gráfico e tabela abaixo]


6) Quais as vantagens da bilhetagem eletrônica?

A bilhetagem eletrônica é uma ferramenta de gestão fundamental para atingir a eficiência, regularidade e controle da qualidade dos serviços de transporte público. Através da bilhetagem eletrônica, é possível ter acesso imediato aos dados da demanda de passageiros no espaço e no tempo. Ou seja,  pode-se determinar informações importantes tais como: a origem das viagens dos usuários; a quantidade de passageiros por veículo e por trecho; o número de transferências entre modos/serviços de transportes; e o valor de tarifa pago para cada viagem. Com base nessas informações, é possível atuar tanto na gestão operacional dos serviços quanto no desenvolvimento de políticas tarifárias. Em termos de gestão operacional, o operador pode ajustar a oferta de serviços de acordo com as características da demanda. Ou seja, se for detectado que a demanda não está sendo adequadamente atendida, podem ser realizadas alterações na frequência dos serviços, nas características dos veículos utilizados e até mesmo na rota e nas paradas de embarque e desembarque. Por outro lado, o entendimento das necessidades dos usuários permite o desenvolvimento de políticas tarifárias diferenciadas. Um exemplo de sucesso de política tarifária desenvolvida a partir de dados de bilhetagem eletrônica é o caso do Bilhete Único do Rio de Janeiro. Através da análise dos dados, verificou-se que seria benéfico para toda a população da região metropolitana do Rio de Janeiro a criação de estrutura tarifária comum, para que permitisse a integração dos serviços e aumentasse a acessibilidade dos usuários. Foi possível quantificar os beneficiários, as respectivas inserções na estrutura tarifária e o custo do subsídio que o Estado disponibilizou para manter o sistema diariamente.

7) Pode dar um exemplo de municípios com práticas inovadoras em política tarifária no Brasil?

Quem mais está avançando em política tarifária no Brasil é o município de São Paulo. A ideia é separar a tarifa pública do custo do serviço. Há alguns anos à Prefeitura de São Paulo subsidia diretamente o serviço de transporte público. Está investindo pesadamente na construção de corredores exclusivos de transporte público para aumentar a velocidade comercial dos ônibus e melhorar a oferta de serviço com qualidade. O que importa é o nível de serviço de alto padrão a ser oferecido. Como isto custa caro, a solução é criar um Fundo Nacional de Transporte Público, a ser constituído com uma taxa extra sobre o preço da gasolina, de forma que estes recursos possam ser utilizados para subsidiar o custo do serviço sem necessidade de reajustar a tarifa.

8) Como se dá a cobertura dos custos da bilhetagem?

Os custos da implantação, operação e manutenção da bilhetagem eletrônica são atualmente repassados aos operadores de serviços de transporte público por ônibus. As empresas operadoras e/ou entidades patronais (sindicatos/associações) possuem estruturas altamente profissionais para que os serviços de bilhetagem eletrônica sejam confiáveis e disponíveis a toda a população. Em muitos casos, os contratos entre as empresas operadoras e órgãos gestores incluem a responsabilidade da bilhetagem eletrônica.

9) Em Belo Horizonte podemos falar de integração intermodal (metrô/trem) e metropolitana (intermunicipal)? Como avalia esse serviço?

Já houve um tempo em que os serviços de transporte por ônibus de Belo Horizonte e Região Metropolitana era parte de um só sistema. Essa concepção funcionou por algum tempo, mas não deu certo. Hoje, os sistemas são independentes e cada um busca seu próprio equilíbrio. Dentro dessa filosofia, é possível a integração desde que um sistema não transfira ônus para o outro. Se isto acontecer, a parte responsável deverá subsidiar a outra de modo a manter seu equilíbrio econômico.